10 de dez. de 2010

DROGAS LIBERAR GERAL É SOLUÇÃO,PROIBIR E CRIMINALIZAR??


DROGAS : LEGALIZAR, TOLERAR OU PROIBIR
Delegacia de repressão a entorpecentes, Divisão de repressão a entorpecentes, Coordenação de repressão a entorpecentes, Departamento de Narcóticos, e muitos outros cargos e funções de nomes pomposos. É o que rendeu até agora a luta especializada da polícia contra o tráfico de drogas. Milhares de cruzeiros, cruzados, reais e até dólares, gastos neste combate. Dezenas de policiais mortos, feridos, acuados ou corrompidos na luta diária contra as drogas.
Ah, não sejamos injustos, muita estatística também foi produzida por vários envolvidos nesta luta. Estatísticas estas todas tristes, mais ainda, estarrecedoras e desconcertantes. Tantos milhões de viciados, e entre estes um alto percentual de soropositivos contaminados pelo compartilhamento de seringas. Tantos milhões de dólares aplicados no combate aos entorpecentes, em vez de em casas populares, geração de empregos, saneamento básico, etc.
Infelizmente não para por aí, colecionamos ainda outros dados alarmantes, como por exemplo um número enorme de jovens e pais de família viciados, muitos policiais confusos, desviados, corrompidos, feridos ou mortos, pelo poder dos cartéis das drogas. Vidas inocentes ceifadas ou abreviadas por balas perdidas ou em confrontos com rivais. E, o que torna ainda mais improfícua toda a ação antidrogas, o poderoso aparato de apoio ao crime montado nas entranhas da própria polícia, do Ministério público, do Judiciário, das instituições financeiras, e até do Poder Legislativo em todos os níveis, que revive os Judas e os lobos em pele de cordeiro.
Em artigo publicado em julho de 2001, a conceituada revista The Economist cita que, apesar de os EUA gastarem de 35 a 40 bilhões de dólares ao ano, do contribuinte americano, no combate às drogas, o preço da cocaína e da heroína, caíram pela metade nas décadas de 1980 e 1990, o que significa que aumentou a oferta. Não é de todo descabida a desconfiança de que a superpotência americana usa o proibicionismo extremo das drogas apenas como uma desculpa para intervir, às vezes militarmente, em países como Colômbia, Bolívia, Peru, Afeganistão, Turquia, e manter assim sua influência global.
No entanto, afortunadamente o ser humano sofre de otimismo crônico, e todos ficam tranqüilizados ao ouvir que agora o crime organizado está sendo enfrentado da forma correta, através do combate globalizado à lavagem de dinheiro. Longe de nós querermos ser agourentos, mas não conseguimos nos furtar à seguinte reflexão: Será que o dinheiro sujo do crime e o dinheiro sujo da corrupção não usam as mesmas lavanderias? Será que os políticos e poderosos deixariam que se aprofundasse uma investigação que desvendasse suas artimanhas?
O certo é que a droga é motivo de guerra e destruição desde final do século XIX com a Guerra do Ópio, que terminou com a China entregando Hong-Kong à Inglaterra por 150 anos, como compensação por ter destruído 1300 toneladas de ópio da Índia, então colônia inglesa. Mais tarde, em 1909, na Conferência de Xangai, várias nações reunidas decidiram pela proibição da produção do ópio, proibição esta não muito obedecida. A China procurou então, apoio nos já influentes Estados Unidos da América, através da Liga das Nações, e foi então convocada em 1911 a Convenção de Haia.
A China pretendia obter na Liga das Nações, uma resolução que proibisse a Inglaterra de continuar produzindo ópio em suas colônias asiáticas. Já então vemos como a questão das drogas se mistura com economia e política, na presteza com que os Estados Unidos apoiaram a pretensão chinesa, que atingiria uma importante fonte de renda e poder do Império Britânico. A Inglaterra, então, para não perder sozinha, exigiu que fossem incluídos nas discussões os derivados do ópio, como a morfina, a heroína e a codeína, e também a cocaína. A Convenção de Haia se encerrou em janeiro de 1912, com a proibição da cocaína, do ópio e de seus derivados, excetuando-se desta proibição a codeína, que tem largo uso medicinal. Não é a toa que a década de 1920, quando efetivamente entrou em vigor a Convenção de Haia, ficou marcada pelo surgimento de grupos criminosos violentos e organizados, a maioria deles ligados ao comércio de drogas.
Têm surgido, atualmente, em todos os continentes, vários movimentos anti-proibicionismo, alguns defendendo a liberação ou a descriminalização do uso da maconha, outros defendem o mesmo tratamento só que para todas as drogas atualmente proibidas, e têm ainda os que defendem não só a descriminalização mas a legalização total de todas as drogas.
Todos os que defendem estas posições se apóiam em argumentos interessantes. Como já citado antes, em que pese o volume sempre crescente de recursos gastos no combate às drogas, estas se disseminam em progressão geométrica pelo mundo, o que nos evoca a figura mitológica da Hidra de Lerna, que ao ter uma de suas cabeças cortadas, imediatamente a recriava. Os adeptos da liberação defendem ainda, que a proibição cria o “efeito do fruto proibido”, fazendo crescer o consumo principalmente entre os jovens. Outro tema largamente discutido, inclusive em meios acadêmicos e jurídicos, é o destino dado aos recursos arrecadados pelo tráfico de drogas. Sendo dinheiro de origem ilícita, obviamente não circula pelos canais da economia, alimentando o crime organizado como um todo, a corrupção policial e do judiciário, e mesmo financiando campanhas de políticos comprometidos com os interesses de seus financiadores.
O fato é que o tráfico de drogas, entre outros fatores, insufla a violência e a criminalidade, trazendo insegurança generalizada à sociedade. Após quase um século da implementação das proibições da Convenção de Haia, não há muito a comemorar quanto aos benefícios trazidos por ela. O volume de drogas consumido cresce a cada ano, novas drogas sintéticas de efeito maléfico impressionante no organismo surgem constantemente. Uma intervenção militar e policial não declarada dos EUA na Colômbia, não foi capaz de erradicar os plantios de coca e papoula na região, tendo como resultado mais comemorado a prisão e a morte de Pablo Escobar, o que serviu apenas para fazerem surgir novas lideranças e novos cartéis, mais modernizados e organizados, como a Hidra da mitologia.
Diversas personalidades políticas e intelectuais pelo mundo, acenam com a necessidade de ao menos repensar o atual sistema de repressão às drogas. Em recente solenidade comemorativa dos 200 anos da Universidade de Antioquia na Colômbia, que contou com a presença do presidente Álvaro Uribe, o escritor colombiano Garcia Márquez disse ”...não é imaginável o fim do tráfico sem que se produza a legalização do consumo”. Em outro documento intitulado “À Pátria amada, ainda que distante”, o mesmo Garcia Márquez defende que “não é possível imaginar o fim da violência na Colômbia sem a eliminação do narcotráfico, e não é possível imaginar o fim do narcotráfico sem a legalização da droga, mais próspera a cada instante, quanto mais é proibida”.
Em recente artigo intitulado “A droga e a dependência da ONU”, Walter Fanganiello Maierovitch, ex Secretário Nacional Anti-drogas, e conhecido adversário do proibicionismo extremo da política americana conhecida como “War on Drugs”, guerra às drogas,  cita relatório da ONU que estima uma movimentação anual de US$400 bilhões do tráfico de drogas, mais US$ 290 bilhões do tráfico de armas”, e diz que todo esse montante circula pelos canais internacionais de lavagem de dinheiro. Maierovitch cita ainda, o desconforto e isolamento dos representantes americanos nos órgão multilaterais da ONU que lidam com a questão das drogas, e em seus relatórios criticam asperamente as ONG’s que procuram introduzir políticas de redução de danos, que segundo eles seria um passo em direção à legalização.
Walter Maierovitch se refere ainda, a novas políticas que têm sido implementadas por diferentes países europeus, como Inglaterra, Alemanha, Holanda, Suíça, Espanha, e até pelo Canadá, na direção de uso medicinal e terapêutico de drogas como a heroína e a maconha. Há ainda, casos como a Inglaterra e o Canadá que aprovaram leis descriminalizando o porte de pequenas porções de maconha. Alguns destes países adotaram, como medida sanitária, as narcossalas (safe injection rooms), como uma forma de ter um local especial para o uso de drogas, sem o risco de contaminação. O ex-juiz cita como outro resultado negativo da guerra às drogas da Casa Branca, o êxodo de populações rurais de áreas de cultivo, que tiveram plantações erradicados ou fumigadas indiscriminadamente. Este êxodo acabaria por acelerar o desmatamento de regiões de floresta amazônica, e no caso dos plantadores de papoula do Afeganistão, a migração de grandes contingentes de desempregados para outras modalidades criminosas.
Em 1992 Gustavo de Greiff assumiu a Procuradoria Geral da Colômbia, e teve como um dos maiores feitos de sua administração a prisão de Pablo Escobar, e o desmantelamento do Cartel de Medellín. Virou herói. De Greiff, no entanto, contrariou os mandamentos anti-drogas da superpotência, e não desfrutou seu prestígio por muito tempo. Em 1994, em uma conferência sobre drogas em Baltimore, EUA, declarou-se a favor da legalização das drogas, dizendo que “a proibição é um desperdício de energia”. No mesmo ano o Procurador deixou o cargo e a Colômbia, e foi ser professor universitário no México.
Segundo a argentina Silvia Inchaurraga, secretária executiva da Rede Latino americana de redução de danos (RELARD), “legalizar as drogas não é legalizar as substâncias, é legalizar uma abordagem mais racional, efetiva, e humana dos problemas associados a elas e ao seu consumo. É uma alternativa à atual legalização de mentiras como a teoria da escalada (usar maconha leva a usar cocaína). A legalização é uma alternativa aos danos da proibição: contaminação de Aids pelo uso de seringa, violência policial, mercado clandestino, adulteração de substâncias e sobredoses.”
O atual Secretário Nacional Anti-drogas, General Paulo Roberto Uchoa diz que o debate da descriminalização ou legalização ainda não chegou à SENAD, “mas vai chegar, e vamos discuti-lo, com isenção, espírito aberto, ouvindo todos os segmentos da sociedade. O Governo e a SENAD vão defender a posição que a sociedade adotar.”
O Psiquiatra, professor, doutor, e pesquisador da Escola Paulista de Medicina da UNIFESP, Ronaldo Laranjeira, por outro lado recomenda cautela na discussão da descriminalização do porte ou da legalização, levando em conta princípios de saúde pública. Ele alerta que toda política em relação a qualquer substância danosa à saúde, lícita ou ilícita, deve priorizar a redução do consumo total, e que uma eventual liberação faria aumentar o consumo devido à oferta maior e mais aberta. O pesquisador cita, ainda, o exemplo da Lei seca nos EUA nos anos 1920, que logrou diminuir drasticamente o consumo de bebidas alcoólicas naquele País, mas por outro lado, fez crescer o crime organizado, o contrabando e a lavagem de dinheiro, bem como constatou-se um número elevado de casos de intoxicação por ingestão de bebidas de procedência e qualidade duvidosas. Laranjeira defende que não há qualquer indicação de que a liberação total ou parcial das drogas seja benéfica para a sociedade, mas afirma que caso seja adotada, nunca deve acontecer desacompanhada de uma política de tratamento, desincentivo ao uso e redução de danos.
Em certos países onde a discussão está mais adiantada, já surgem questões como se em caso de liberação, o cultivo, produção e distribuição seriam terceirizados, sob concessão e fiscalização estatal, ou operados diretamente pela iniciativa privada, seguindo moldes já aplicados ao tabaco e ao álcool.
O certo é que a questão é altamente polêmica, e sua discussão apenas engatinha. É notório também que o assunto envolve fortes paixões, às vezes por experiências pessoais ou próximas, outras por convicções religiosas ou morais, a exemplo de outros como transgênicos, aborto, células tronco, clonagem, etc. O que não dá para negar, no entanto, é que o modelo atual está desgastado e desacreditado. A sociedade de nossos dias não conseguirá evitar por muito mais tempo encarar estes questionamentos, racionalmente, sem paixões e sem precipitações. Nós policiais, mais do que qualquer cidadão, deveríamos remover os véus que envolvem o tema, e nos perguntar seriamente até quando vai se sustentar este modelo, em que a polícia finge que previne e reprime o tráfico, o judiciário finge que faz justiça, e todos vamos pra casa com a sensação do dever cumprido.
Ficarei realizado se após este artigo, me deparar com colegas, que entre uma apreensão e outra, se detenham para se perguntarem se estão fazendo tudo que deveriam a respeito das drogas. Terei atingido meu objetivo se estas considerações suscitarem reflexões e questionamentos que contribuam para o debate. Os policiais federais têm entre suas atribuições, por força de norma constitucional (Art 144 §1º Inciso II), o combate ao tráfico de entorpecentes. Por que então não liderar, ou ao menos ter uma postura pró-ativa que contribua para repensar um tema de importância tão capital para a sociedade, sociedade esta para cuja segurança a Polícia Federal existe

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QUEM NÃO OUSARIA????????

QUEM NÃO OUSARIA????????
COLHER TÃO LINDA ROSA?????

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